Preciso mais disso que você
Um lugar lindo. Enquanto Joe dirige, meus olhos percorrem a paisagem, tentando absorver cada detalhe. Perdão. Absolvição. Hoje, essas palavras ganham um novo sentido. Quero uma vida onde todos os que me importam estejam presentes, quero perdoar e absolver quem se culpa. Nossa maior virtude é saber quando esquecer certas coisas.
O caminho se revela lindo: uma chácara, quase uma pequena fazenda, afastada da cidade e um tanto escondida, mas sem perder a beleza singular. A casa é grande, imponente e belíssima, com um estilo rústico que revela personalidade. Fico parada na porta por alguns instantes antes de bater. Joe percebe minha relutância, segura minha mão e aperta levemente, um encorajamento silencioso. Inspiro fundo e, antes que a coragem me abandone, bato. Ouço passos. A porta se abre, e um menino de cabelos castanhos e olhos verdes intensos surge. Ele me encara por alguns instantes e faz o que jamais poderia imaginar.
— Irmããã! Eu queria tanto conhecer você, mas a mamãe sempre dizia que não era a hora. — Ele me abraça forte pela cintura. Deve ter uns oito anos. Não sei bem o que fazer, mas o abraço de volta, um instinto que me preenche.
— Olá, eu sou Lily.
— Eu sei! Sou Tomás. Vem. — Ele segura minha mão e me puxa para dentro. A casa é realmente grande, ampla, e um cheiro delicioso de biscoitos de nata com raspas de limão paira no ar. Alguém grita de dentro da casa.
— Tom, querido, quem é?
— Minha irmã, mamãe!
— Sua o quê? — E lá está ela. Minha mãe. Com um vestido largo e os pés descalços, cabelo preso em um coque desarrumado, usando avental. Posso dizer com toda certeza que é ela a responsável pelo cheiro de biscoito. Eu sorrio para ela, e minha mãe — engraçado dizer "minha mãe" — parece sem graça, quase tímida.
— Oi. Eu queria saber onde morava e te conhecer um pouco.
— Claro, querida. Hã… Sente-se. Vou buscar um suco. Hoje Tom me pediu para fazer biscoitos para ele levar à escola.
— Mamãe, minha irmã pode me levar na escola? Meus amigos vão ver só!
— Não, querido. Ela deve estar cansada, e você tem que tratar melhor seus colegas.
— Mas se ela me levar, eles vão ver que ela é de verdade! Lys, você me leva? — Posso não ter crescido com ele, mas eu o entendo perfeitamente. E posso dizer que faria qualquer coisa por ele.
— Claro. Onde estuda?
— É pertinho, não se preocupe! Quero te apresentar para todo mundo.
— Ótimo! Tenho certeza que vou gostar. — Ou não, mas não se pode prometer a uma criança e não cumprir.
— Tom, vá para o banho. Eu e sua irmã temos alguns assuntos.
— Tá, mas promete que ela não vai mais embora! — Eu o encaro. Não sei quanto tempo ele esperou por mim. Eu não sabia que ele existia até quinze minutos atrás, mas ele sabe de mim desde que nasceu, pelo visto.
— Eu prometo. Palavra de escoteiro. Vai lá, irmão.
— Você é cafona — ele diz, e sai correndo.
Quando volto a atenção para minha mãe, ela ainda está sem saber o que dizer.
— Quero pedir desculpas por ter demorado para vir aqui.
— Lys, a única pessoa que precisa pedir desculpas aqui sou eu. Passei tantos anos com medo, que esqueci que você também sentia medo.
— Como sobreviveu?
— Gideon me salvou. Ele me tirou do carro antes de explodir. Seu pai sabia que eu estava viva, mas ele me impediu de chegar até você. Mas eu vi você crescer, e te ajudei da maneira que pude.
— Foi você que fez minha herança ficar maior? Douglas nunca me explicou de onde saiu o dinheiro.
— Não. Seus avós paternos morreram e te deixaram uma herança. Martha se apossou dela, então consegui fazer ela devolver. E ajudei com um pouco, nada significativo, perto do que deveria ter te dado, que era meu cuidado e minha presença.
— Você não podia naquele momento. Mas pelo que parece, tem feito um bom trabalho com o Tom.
— Sim, ele é um menino especial. Teve problemas de saúde quando nasceu. Quando ele tinha três anos, quase nos deixou. Foi então que contei a ele sobre você. Diria que ele ficou tão empolgado que queria te ver quase sempre. Então eu o levava para assistir seus jogos na escola, e depois da morte do seu pai, assim que abriu a escola de artes, ele fazia aula de música, e ele te via quase sempre. Ele dizia "Mamãe, ela é boazinha, por que não posso falar que ela é minha irmã?". Então eu dizia que agentes secretos não se revelam. Eu quis ir até você tantas vezes, mas tive medo.
— Talvez naquela época eu não fosse receber você tão bem.
— Mas seria um começo. Fui covarde por vezes. E quando vi a notícia de que você havia desaparecido, entrei em pânico. Foi como se levassem parte de mim. Eu tinha que fazer alguma coisa.
— Obrigada. Não estou dizendo que não fiquei chateada por você me deixar. Mas a vida está me dando uma segunda chance, e não quero desperdiçá-la te odiando. E o tio Ben está bravo com você por nós dois. Quero que faça parte da minha vida, não só porque é minha mãe, mas porque quero ser sua amiga também.
— Oh, Lys! Você amadureceu, minha menina! Eu nunca te amei menos, só não sabia como agir. E obrigada, por isso.
Quem diria que um dia eu abraçaria minha mãe? Há algum tempo, parecia impossível. Mas agora, não só é possível, como também é real.
Comentários
Postar um comentário